Sem querer, ontem comi um pastel de forno do lado contrário. Assim: normalmente, comemos um pastel de forno com a parte da barriga virada para fora, certo? A parte lisa fica virada para a gente. Peguei o troço sem olhar muito e peguei “errado”. E aí minha primeira mordida foi diferente do que eu inconscientemente estava esperando.
Rapidamente fui tomada por uma sensação estranha que me fez olhar para o pastel. Diria que até o gosto chegou a ser outro. Minha quase reação imediata foi querer virar o pastel e colocá-lo em seu devido lugar. Mas algo me segurou. Parei. Olhei de novo para ele e pensei: ‘vou comer ele todo assim, de bunda para mim’.
Confesso que não foi uma refeição tranqüila. Não consegui me desligar do fato e as mordidas subseqüentes continuaram com um quê de estranhas. Encontrei dificuldades até no movimento da mão até a boca. Às vezes ia errado também, como se eu fosse uma retardada que não conseguisse acertar a minha própria boca. A coisa ia meio torta. Uma luta foi travada entre o meu cérebro e a minha mão. E tive que fazer isso tudo (acabar de comer o pastel) parada no meio da rua porque foi impossível continuar andando. Se não, o pastel ia para Deus sabe onde...
Ufa! Consegui. Mas fiquei com essa questão na cabeça: estamos tão acostumados com certas coisas que elas entram no automático e nem percebemos o que estamos fazendo. Se não fosse o pastel do lado do avesso eu ia apenas colocar algo para dentro para tapar o buraco do estômago e seguir andando com pressa pelo Jardim Botânico. E eu nem estava com pressa. Sou uma desempregada. Não faço muita coisa. Tinha ido só ao dentista e dali estava voltando para casa.
Foi então que decidi quebrar a rotina de outros atos aparentemente corriqueiros. Assim que cheguei em casa, fui escovar os dentes com a mão esquerda. Se eu achava que parecia uma retardada antes, imagina agora com o extra de estar me olhando no espelho... Mas foi divertido. Fiquei rindo de mim mesma. Ficar sozinha em casa tem dessas coisas. Você ganha liberdade para rir de você mesmo.
Mais tarde, na hora do almoço, troquei a posição dos talheres. Já tentou cortar um peito de frango com a mão errada? É difícil... Bom, pelo menos, comi menos. Demorei tanto entre uma garfada e outra que deu tempo do meu cérebro avisar ao meu estômago que já estava tudo ok. Viu? Há vantagens. Posso passar a comer menos agora e emagrecer.
Continuando na linha da boa forma, chegou o momento de correr. Pensei em colocar os pés trocados do tênis, mas achei que estava indo longe demais e entrando no departamento da tortura. Mas troquei de emissora de rádio. Sempre corro ouvindo a Mix, com aquelas musiquinhas batidas que tocam na night e que eu nunca ouviria em casa ou compraria um CD, mas adoro ouvir no carro e para correr. (Não vou mais para esse tipo de night há muito tempo...) Fui correr escutando música clássica e me senti num comercial de TV, quase flutuando, fora do ritmo das pessoas que andavam na rua. Foi uma experiência.
Tomei banho no outro banheiro, usei o shampoo do respectivo e, à noite, nos obriguei a jantar na mesa. (nunca jantamos na mesa, só no sofá, em frente à TV). Uma coisa meio novela, sabe? Com jogo americano de palhinha, taças de vinho e uma salada arrumadinha. Muito chique.
Fui muito bem até aí. E estava satisfeitíssima com o meu propósito de ver as coisas de outra maneira, sentir por outro ângulo. Mas tenho que assumir. Nadei, nadei, nadei e morri na praia. Traí meu experimento antropológico de madrugada. Resolvi que dormiríamos em lados trocados da cama. Não consegui pregar o olho até eu desistir e empurrá-lo de volta. Me senti como um Big Brother numa prova do líder de resistência. Aquele que vai até o fim e perde no último minuto. Acordei arrasada.
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Um comentário:
Amiga,
Você está escrevendo muito bem! E as historinhas são muito criativas e divertidas. Parabéns!!
Beijo Da Deca
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